Crenças que limitam a inovação e a transformação digital nas organizações — e como superá-las
- Fabio de Freitas
- 27 de mar.
- 5 min de leitura

Em tempos de mudança acelerada, liderar a inovação e a transformação digital tornou-se uma prioridade inadiável para as organizações. CEOs, CIOs, CFOs, CHROs, CMOs — todos os C-Levels estão imersos em decisões estratégicas que envolvem tecnologia, cultura, processos e novos modelos de negócio.
Mas, apesar das boas intenções e dos investimentos crescentes, muitas iniciativas patinam ou não entregam o impacto esperado. Por quê? A resposta pode estar nas crenças profundamente enraizadas que direcionam nossas decisões. Algumas dessas ideias parecem intuitivas e fazem sentido à primeira vista, mas, na prática, podem se transformar em barreiras sutis à verdadeira transformação.
Neste artigo, vou explorar cinco dessas crenças comuns no topo das organizações que, embora bem-intencionadas, limitam o potencial da inovação.
1. Transformação digital não começa com tecnologia
A ideia de que transformação digital se resume à adoção de novas ferramentas tecnológicas ainda é bastante difundida. No entanto, a tecnologia, embora essencial, não deve ser o ponto de partida. Quando priorizada sem uma revisão do modelo de negócio, da cultura organizacional e da lógica de entrega de valor, o resultado tende à frustração.
Transformação digital, de fato, é multidimensional. Envolve repensar a cultura, o modelo de negócio, os processos, a forma de liderar e, só então, escolher as tecnologias que melhor sustentam esse novo desenho. Empresas como Nubank, Magazine Luiza e Bosch colocaram o cliente e a cultura digital no centro da mudança, e não os sistemas.
Claro, a tecnologia é parte importante dessa equação. Mas, como já demonstrado por inúmeras pesquisas da Gartner, MIT Sloan e McKinsey, entre outras, as empresas que mais se beneficiam da transformação digital são aquelas que enxergam a tecnologia como viabilizadora de uma nova lógica de operação, cultura e entrega de valor. A pergunta essencial não é “quais tecnologias devemos adotar?”, mas sim: “Como queremos evoluir nosso negócio para entregar mais valor ao cliente? E de que forma a tecnologia pode nos ajudar nisso?”
A verdadeira transformação digital é multidimensional:
• Cultura organizacional: engajamento, autonomia, inovação contínua;
• Modelo de negócio: revisão de proposta de valor, canais e formas de monetização;
• Processos: repensar fluxos com foco em cliente, dados e adaptabilidade;
• Liderança: protagonismo digital, abertura à experimentação e aprendizado;
• Tecnologia: automação, integração, escalabilidade e inteligência de dados.
“A verdadeira maturidade digital ocorre quando os processos deixam de ser fragmentados e operacionais para se tornarem integrais, orientados por valor e gerenciados de ponta a ponta, com foco em impacto real.”
2. Digitalizar processos não é o mesmo que transformar
Automatizar tarefas, implementar RPAs ou integrar sistemas são iniciativas extremamente relevantes, mas não necessariamente transformadoras. Digitalizar um processo burocrático ou mal desenhado apenas o torna mais rápido. Pode até trazer ganho operacional e/ou de redução de custos, mas sem gerar ganhos estratégicos.
A verdadeira transformação exige redesenho. É necessário partir das jornadas dos clientes, revisar as restrições herdadas e usar a tecnologia como meio de experimentação e criação de valor. O caso das fintechs ilustra bem essa abordagem: em vez de digitalizar o modelo bancário tradicional, elas criaram modelos mais simples, transparentes e centrados no cliente.
Transformar é reimaginar com base no que o contexto atual exige — não apenas digitalizar o que já existia. Isso acontece porque o foco permanece no “como fazemos”, e não no “por que fazemos” ou “o que deveríamos estar fazendo”.
Empresas que digitalizam sem redesenhar:
• Continuam atendendo demandas internas, e não jornadas de clientes;
• Mantêm silos operacionais, apenas mais conectados;
• Automatizam ineficiências, sem repensar objetivos estratégicos.
“Transformação real exige coragem para abandonar o que sempre funcionou e a visão para criar o que ainda não existe. Digitalizar pode ser o começo, mas nunca deve ser o fim.”
3. Inovação real não se limita a um laboratório
A criação de laboratórios e hubs de inovação tem se multiplicado nas organizações. Embora sejam importantes catalisadores, esses espaços não garantem, por si só, uma cultura inovadora. Esse fenômeno é conhecido no mercado como Innovation Theater: ações altamente visíveis e bem-intencionadas, mas que carecem de conexão com o core do negócio, apoio executivo efetivo ou critérios claros de geração de valor.
A inovação precisa estar ligada aos objetivos estratégicos, disseminada nas áreas de negócio e patrocinada pela alta liderança. O Magazine Luiza é um exemplo de como transformar um laboratório em alavanca organizacional, integrando o LuizaLabs à estratégia de crescimento, cultura de dados e agilidade.
Organizações inovadoras são aquelas em que todos se sentem autorizados a experimentar, errar e melhorar continuamente. Inovação efetiva nasce do alinhamento entre propósito, execução e liderança ativa.
Como evitar cair na armadilha do “lab decorativo”?
1. Defina métricas claras e estratégicas de impacto da inovação — e não apenas quantidade de ideias ou POCs;
2. Estabeleça mecanismos de integração entre lab e áreas de negócio, como squads híbridos, OKRs compartilhados ou times de transição;
3. Treine e incentive líderes de todas as áreas a atuarem como embaixadores da inovação;
4. Reforce a governança e o patrocínio executivo. Inovação precisa estar no board e gerar valor, real, para a empresa.
“Inovação de verdade acontece quando deixa de ser um departamento… e se torna uma competência organizacional.”
4. Dados são ativos estratégicos, não apenas visualizações
A crença de que Business Intelligence (BI) se resume à criação de dashboards elegantes e relatórios automatizados é ainda comum, mas limita profundamente o potencial dos dados. Dashboards são apenas interfaces, o valor real está naquilo que se faz com os dados.
A maturidade analítica envolve cinco estágios: descritivo, diagnóstico, preditivo, prescritivo e adaptativo (com IA). A maioria das empresas ainda opera nos dois primeiros. Cria avantagem competitiva está nos últimos.
Organizações como a Netflix utilizam dados de forma estratégica e integrada — para desenvolvimento de produtos, marketing, precificação e decisões em tempo real.
“Dados são o novo petróleo”, dizem. Mas só viram combustível quando são refinados, integrados, compreendidos e usados com inteligência.”
5. Inovação é uma responsabilidade de todos, não de uma área
Quando a inovação é delegada exclusivamente ao time de TI, ao CDO ou a uma célula especializada, ela se isola do negócio e perde força estratégica. Inovação precisa ser tratada como competência organizacional, não como função isolada.
Empresas como a 3M demonstram o poder da inovação distribuída. Com a política dos 15% do tempo para projetos próprios, a empresa mantém uma cultura vibrante de criação contínua.
O papel da liderança é criar o ambiente, remover barreiras e incentivar que todas as áreas inovem de forma alinhada à estratégia.
“A inovação não é uma iniciativa. É uma mentalidade. Quanto mais distribuída for, mais resiliente, escalável e autêntica ela será.”
Conclusão
Por fim, a Transformação digital e Inovação exigem uma nova forma de pensar o negócio. Não basta adotar tecnologia, digitalizar processos ou montar labs. É preciso transformar mentalidades, estruturas e culturas.
As organizações que avançam são aquelas que desafiam suas próprias crenças, compartilham responsabilidades e tomam decisões com base em dados e propósito. A liderança que compreende isso não apenas se adapta ao futuro. Ela o constrói.
Este artigo contou com apoio da ferramenta Perplexity para validação de fontes e cruzamento de dados.
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